“Aquarius", Mills e "A Imaginação Sociológica"

Pretendi discutir o espaço para a criatividade e a interpretação no estudo da relação entre indivíduo e estrutura, segundo os pressupostos de Whrigt Mills acerca do conceito de “Imaginação Sociológica”, lido como bibliografia do curso de Introdução à Sociologia, ministrado pelo professor Michel German no IFCS - UFRJ no segundo semestre de 2022.

LEITURAS

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Parto da lembrança do filme “Aquarius" de Kleber Mendonça Filho, para ilustrar o que abordo neste texto.

A “Imaginação Sociológica” para Mills, permite relacionar a esfera privada da vida com a estrutura social e a história. Permite transitar entre escalas e complexidades variadas de uma mesma questão ou perceber relações entre eventos aparentemente desconexos, se vistos do limite dos horizontes estreitos da experiência cotidiana.

Mills coloca como os cenários próximos do mundo cotidiano nos constrangem a não transcender, o que ele chama, das nossas "perturbações" particulares, nem compreender o quanto impactam e são impactadas por "questões" estruturais da sociedade em que vivemos, o que torna a criatividade fundamental para a razão.

A criatividade atua como guia nas passagens em que a razão se oblitera com o que Mills chama de “Idade do Fato”, na qual vivemos - em que a quantidade de informação é capaz de superar a nossa capacidade de assimilação e análise - além de ampliar o horizonte de possibilidades de interpretação da realidade do seu momento histórico.

“A imaginação sociológica nos permite compreender a história e a biografia e as relações entre ambas, dentro da sociedade. Essa é a sua tarefa e a sua promessa.” (MILLS, 1965, p. 12).

É, sobretudo, um antídoto capaz de tirar do homem a sensação de impotência diante de impactos na vida particular de decisões tomadas em outras esferas de poder, e das possibilidades de ação à partir da sua posição na estrutura social. Abre a possibilidade do entendimento de sua experiência em comum com a de todos os outros que vivem nas mesmas circunstâncias sociais e históricas que ele. A possibilidade de atuar organizando a sua participação nas questões públicas.

“Hoje, a principal tarefa intelectual e política do cientista social - pois as duas aqui coincidem - é deixar claros os elementos de inquietação e da indiferença contemporâneas.” (MILLS, 1965, p. 20).

No que cabe ao cientista social, MILLS é claríssimo de novo, Já que ele identifica na alienação que as geram o principal causador do mal estar que nos aflige em nossa época.

Mais que isso Mills considera a "imaginação sociológica” uma marca cultural da nossa "época intelectual”, incontornável na medida em que é apropriada pelos atores sociais e passa a ser objeto além de práxis. Para Mills, a criatividade e a interpretação são necessárias. Não há como fazer um estudo sério da relação entre indivíduo e estrutura sem cultivar a criatividade e sem considerar “os usos culturais da imaginação sociológica, e o sentido político dos estudos do homem e da sociedade.” (MILLS, 1965, p. 20).

Penso muito nisso depois de assistir os filmes de Kléber.

BIBLIOGRAFIA

AQUARIUS. Filme. Direção: Kleber Mendonça Filho. Produção de E. Lesclaux, S. B. Saïd & M. Merkt. Recife: Vitrine Filmes, 2016. 141 min.

MILLS, Charles Wright. A Imaginação Sociológica. Zahar, Rio de Janeiro, 1972.